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Miguel Torga

 

BIOGRAFIA
BIBLIOGRAFIA

 

Mãe:
Que desgraça na vida aconteceu,
Que ficaste insensível e gelada?
Que todo o teu perfil se endureceu
Numa linha severa e desenhada?

Como as estátuas, que são gente nossa
Cansada de palavras e ternura,
Assim tu me pareces no teu leito,
Presença cinzelada em pedra dura,
Que não tem coração dentro do peito.

Chamo aos gritos por ti – não me respondes.
Beijo-te as mãos e o rosto – sinto frio.
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes
Por detrás do terror deste vazio.

Mãe:
Abre os olhos ao menos, diz que sim!
Diz que me vês ainda, que me queres.
Que és a eterna mulher entre as mulheres.
Que nem a morte te afastou de mim!

MIGUEL TORGA
(Diário IV)


Biografia Início

Imagem de Miguel Torga Miguel Torga é o pseudónimo literário de Adolfo Correia da Rocha.

Nasceu em S. Martinho de Anta (Sabrosa), pequena aldeia de Trás–os–Montes, no distrito de Vila Real, em 12 de Agosto de 1907 e morreu em Coimbra, em 1995.

Em 1918 ingressou no seminário de Lamego, para iniciar os estudos liceais, donde saiu ao fim de um ano. Entre 1920 e 1925 esteve emigrado no Brasil, tendo trabalhado na fazenda de um tio, em Santa Cruz (Minas Gerais). Ainda no Brasil, chegou a frequentar o ensino liceal em Leopoldina, a expensas do tio, que continuou a ajudá-lo financeiramente noa anos seguintes. De regresso a Portugal, em apenas três anos lectivos completou o ensino liceal e ingressou na Faculdade de Medicina de Coimbra em 1928, tendo concluído o curso em 1933.

Logo em 1934 adopta o pseudónimo literário de Miguel Torga, que manteria ao longo de toda a sua vida, como que a demarcar claramente o homem do escritor. Com ele marca de forma indelével a sua ligação à terra natal, já que "torga" é, afinal, a urze, planta espontânea no norte e centro do país.Obtida a especialização em otorrinolaringologia, acaba por estabelecer-se em Coimbra, em 1939, onde permanecerá até ao fim da vida. Nesse mesmo ano casa com Andrée Crabbé, belga de nascimento, e professora da Universidade de Lisboa.

A partir de 1937 viaja com frequência, percorrendo vários países, mas esse contacto com o mundo parece reforçar cada vez mais o seu apego às origens — Trás-os-Montes, Portugal, a Ibéria.

Em 1960 é proposto pela primeira vez para o Prémio Nobel, nomeação que viria a ser reiterada em 1978, como manifestação do reconhecimento crescente pela sua obra.

O início da sua actividade literária, coincidente com a sua entrada na universidade, está ligado ao grupo da revista "Presença" (1927), do qual se veio a desligar em 1930 para fundar com Branquinho da Fonseca, outro presencista dissidente, a revista "Sinal", de que saiu apenas um número. Posteriormente, em 1936, esteve ligado ao lançamento da revista "Manifesto", juntamente com Albano Nogueira, da qual foram publicados cinco números. A partir daí manteve-se afastado dos grupos literários e dos próprios circuitos editoriais

Esse alheamento face a grupos e tendências reflecte-se na sua produção literária, onde os modismos estéticos e as filiações ideológicas estão ausentes. O seu percurso literário estende-se pelo século XX fora, à margem das capelas, das tendências, dos grupos, explorando os seus próprios centros de interesse, os motivos que lhe eram caros, numa linguagem própria — alheio aos grupos e ideologias, mas atento ao mundo, sobretudo ao mundo rural, à terra, a essa identidade geográfica, histórica e cultural que era a Ibéria.

A vida urbana parece estar ausente dos seus textos. O que encontramos em todo o lado é a vida rural, melhor dizendo, um ambiente agro-pastoril primitivo, em que a modernidade está ausente, anterior à domesticação do mundo, a rudeza do homem irmanada à força da natureza; um homem que penosamente se ergue da terra e procura construir a sua dignidade. Sobretudo na poesia, recorre com frequência a imagens bíblicas, adequadas a exprimir, quer essa rudeza ancestral, quer um fundo de religiosidade que perpassa pela sua obra.

O mesmo apego que manifestava à terra manifesta-o em relação à família — o pai e a mãe, a mulher e a filha. Inversamente, mantém em relação aos outros um distanciamento tímido. Refugia-se na solidão e na escrita. Distante, foi sempre um homem de temperamento difícil, orgulhoso com os grandes, mais afável com os humildes. O mesmo distanciamento face ao poder político, antes e depois da democracia.

Durante mais de meio século manteve um diário literário, onde as notas em prosa alternam com a poesia, e que é, pelas suas características e duração, uma obra ímpar na literatura portuguesa.

Foram-lhe atribuídos, entre outros, o Prémio Diário de Notícias (1969), o Prémio Internacional de Poesia (1976), o Prémio Montaigne (1981), o Prémio Camões (1989), o Prémio Vida Literária da APE (1992) e o Prémio da Crítica, consagrando a sua obra (1993).


 

Bibliografia: Início

  • Ansiedade – poesia (1928)
  • Rampa – poesia (1930)
  • Tributo – poesia (1931)
  • Pão Ázimo – prosa (1931)
  • Abismo – poesia (1932)
  • A Terceira Voz – prosa (1934)
  • O Outro Livro de Job – poesia (1936)
  • A Criação do Mundo - Os dois Primeiros Dias – prosa (1937)
  • O Terceiro Dia da Criação do Mundo – prosa (1938)
  • O Quarto Dia da Criação do Mundo – prosa (1939)
  • Bichos – prosa (1940)
  • Contos da Montanha – prosa (1941)
  • Um Reino Maravilhoso (Trás-os-Montes) – prosa (1941)
  • Terra Firme. Mar – teatro (1941)
  • Diário I (1941)
  • Rua – prosa (1942)
  • O Senhor Ventura – prosa (1943)
  • Lamentação – poesia (1943)
  • Diário II (1943)
  • Libertação – poesia (1944)
  • O Porto – prosa (1944)
  • Novos Contos da Montanha – prosa (1944)
  • Vindima – prosa (1945)
  • Odes – poesia (1946)
  • Diário III (1946)
  • Sinfonia – teatro (1947)
  • Nihil Sibi – poesia (1948)
  • O Paraíso – teatro (1949)
  • Diário IV (1949)
  • Cântico do Homem – poesia (1950)
  • Portugal – prosa (1950)
  • Pedras Lavradas – prosa (1951)
  • Diário V (1951)
  • Alguns Poemas Ibéricos – poesia (1952)
  • Diário VI (1953)
  • Penas do Purgatório – poesia (1954)
  • Traço de União – prosa (1955)
  • Diário VII (1956)
  • Orfeu Rebelde – poesia (1958)
  • Diário VIII (1959)
  • Câmara Ardente – poesia (1962)
  • Diário IX (1964)
  • Poemas Ibéricos – poesia (1965)
  • Pena de Morte: centenário da abolição da pena de morte em Portugal – prosa (1967)
  • Diário X (1968)
  • Diário XI (1973)
  • O Quinto Dia da Criação do Mundo – prosa (1974)
  • Fogo Preso – prosa (1976)
  • Diário XII (1977)
  • O Sexto Dia da Criação do Mundo – prosa (1981)
  • Antologia Poética – poesia (1981)
  • Diário XIII (1983)
  • Camões – ? (1987)
  • Diário XIV (1987)
  • Diário XV ( ?)
  • Diário XVI (1994)

Copyright © 1998 Jorge Santos
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